Poemas de Machado de Assis

Os poemas de Machado de Assis podem ser encontrados em quatro livros escritos entre os anos de 1864 e 1901: Crisálidas, Falenas, Americanas e Poesia Completa.

Na primeira fase de sua poesia, influências árcades e românticas. Na segunda fase, Machado desenvolveu uma temática pessimista em versos parnasianos

Machado de Assis é um escritor internacionalmente prestigiado e reconhecido como um dos mais importantes autores da língua portuguesa. Sua obra já foi traduzida para diversos idiomas e certamente está entre os clássicos da Literatura Universal. No Brasil, é considerado a expressão maior de nossa Literatura, e sua obra, mais de cem anos após a sua morte, continua sendo relevante e requisito indispensável para quem quer conhecer um pouco mais de nossa produção literária.

Prosador inigualável, escritor de finas e deliciosas ironias — talvez a mais interessante característica de seu discurso —, Machado de Assis também escreveu versos. Embora a poesia de Machado de Assis seja menos conhecida, são de sua autoria os livros Crisálidas, de 1864, Falenas, de 1870, Americanas, de 1875, e Poesias completas, de 1901. A verdade é que seus contos, crônicas, romances e produção teatral são amplamente difundidos ainda hoje, ao passo que sua produção poética ainda carece de ser descoberta, revisitada e apreciada. Explorando a faceta menos conhecida do Bruxo do Cosme Velho, o Brasil Escola traz cinco poemas de Machado de Assis para você conhecer e admirar. Boa leitura!


Machado e Carolina foram casados durante trinta e cinco anos. Na ocasião da morte da esposa, o escritor escreveu o poema A Carolina

A Carolina

Querida! Ao pé do leito derradeiro,

em que descansas desta longa vida,

aqui venho e virei, pobre querida,

trazer-te o coração de companheiro.

Pulsa-lhe aquele afeto verdadeiro

que, a despeito de toda a humana lida,

fez a nossa existência apetecida

e num recanto pôs um mundo inteiro...

Trago-te flores, - restos arrancados

da terra que nos viu passar unidos

e ora mortos nos deixa e separados;

que eu, se tenho, nos olhos malferidos,

pensamentos de vida formulados,

são pensamentos idos e vividos.

ERRO

Erro é teu. Amei-te um dia 

Com esse amor passageiro 

Que nasce na fantasia 

E não chega ao coração; 

Não foi amor, foi apenas 

Uma ligeira impressão; 

Um querer indiferente, 

Em tua presença, vivo, 

Morto, se estavas ausente, 

E se ora me vês esquivo, 

Se, como outrora, não vês 

Meus incensos de poeta 

Ir eu queimar a teus pés, 

É que, — como obra de um dia, 

Passou-me essa fantasia. 

Para eu amar-te devias 

Outra ser e não como eras. 

Tuas frívolas quimeras, 

Teu vão amor de ti mesma, 

Essa pêndula gelada 

Que chamavas coração, 

Eram bem fracos liames 

Para que a alma enamorada 

Me conseguissem prender; 

Foram baldados tentames, 

Saiu contra ti o azar, 

E embora pouca, perdeste 

A glória de me arrastar 

Ao teu carro... Vãs quimeras! 

Para eu amar-te devias 

Outra ser e não como eras...

(Crisálidas – 1864)

LIVROS E FLORES   

Teus olhos são meus livros. 

Que livro há aí melhor, 

Em que melhor se leia 

A página do amor?  

Flores me são teus lábios. 

Onde há mais bela flor, 

Em que melhor se beba 

O bálsamo do amor? 

(Falenas – 1870)


Machado de Assis, em destaque, em meio a um grupo de intelectuais, políticos e escritores. Fotografia do acervo da Biblioteca Nacional

EPITÁFIO DO MÉXICO 

Dobra o joelho: — é um túmulo. 

Embaixo amortalhado 

Jaz o cadáver tépido 

De um povo aniquilado; 

A prece melancólica Reza-lhe em torno à cruz. 

Ante o universo atônito 

Abriu-se a estranha liça, 

Travou-se a luta férvida 

Da força e da justiça; 

Contra a justiça, ó século, 

Venceu a espada e o obus. 

Venceu a força indômita; 

Mas a infeliz vencida 

A mágoa, a dor, o ódio, 

Na face envilecida 

Cuspiu-lhe. E a eterna mácula 

Seus louros murchará. 

E quando a voz fatídica 

Da santa liberdade 

Vier em dias prósperos 

Clamar à humanidade, 

Então revivo o México 

Da campa surgirá. 

(Crisálidas – 1864)

O VERME 

Existe uma flor que encerra 

Celeste orvalho e perfume. 

Plantou-a em fecunda terra 

Mão benéfica de um nume. 

Um verme asqueroso e feio, 

Gerado em lodo mortal, 

Busca esta flor virginal 

E vai dormir-lhe no seio. 

Morde, sangra, rasga e mina, 

Suga-lhe a vida e o alento; 

A flor o cálix inclina; 

As folhas, leva-as o vento. 

Depois, nem resta o perfume 

Nos ares da solidão... 

Esta flor é o coração, 

Aquele verme o ciúme. 

(Falenas - 1870)

Por Luana Castro
Graduada em Letras

Gostaria de fazer a referência deste texto em um trabalho escolar ou acadêmico? Veja:

PEREZ, Luana Castro Alves. "Poemas de Machado de Assis"; Brasil Escola. Disponível em: https://brasilescola.uol.com.br/literatura/poemas-machado-assis.htm. Acesso em 02 de maio de 2024.

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