Dom Quixote

Dom Quixote é um livro do espanhol Miguel de Cervantes. Ele conta a história do louco fidalgo Dom Quixote. O outro protagonista da obra é o camponês Sancho Pança.

Capa do livro Dom Quixote, de Miguel de Cervantes, publicado pela editora Antofágica.
Capa do livro Dom Quixote, de Miguel de Cervantes, publicado pela editora Antofágica.[1]

Dom Quixote é um romance do escritor espanhol Miguel de Cervantes. A obra foi publicada, pela primeira vez, em 1605, e consiste em uma sátira aos romances de cavalaria. Na história, o fidalgo espanhol Alonso Quixano enlouquece após ler muitos romances de cavalaria.

Em busca de glória, ele decide ser um cavaleiro andante, vestido em uma armadura e montado em seu pangaré, Rocinante. Convence um camponês chamado Sancho Pança a ser seu escudeiro. O narrador revela os episódios ocorridos durante as andanças do louco Cavaleiro da Triste Figura e do ingênuo camponês Sancho Pança.

Leia também: Cem anos de solidão — tudo o que você precisa saber sobre a obra

Resumo sobre Dom Quixote

  • Dom Quixote é uma obra da literatura espanhola escrita por Miguel de Cervantes.

  • A história conta sobre o fidalgo espanhol Alonso Quixano, que fica louco após ler muitos romances de cavalaria.

  • Ele vive na região da Mancha, em companhia de uma sobrinha e de uma criada.

  • Dom Quixote convence o camponês Sancho Pança a ser seu escudeiro.

  • Dom Quixote, com armadura e sobre o pangaré Rocinante, é acompanhado pelo escudeiro, que vai montado em um jumento.

  • O narrador apresenta vários diálogos e histórias contadas por personagens durante a narrativa.

  • O padre e o barbeiro, amigos do fidalgo, escolhem vários livros da biblioteca do protagonista e os queimam, pois seriam os causadores da loucura de Dom Quixote.

  • Eles tentam convencer o fidalgo a voltar para casa e esquecer essa ideia de ser um cavaleiro andante.

  • Dom Quixote passa a chamar uma camponesa de Dulcineia, a qual seria sua dama idealizada.

  • O fidalgo acha que os moinhos de vento são gigantes, confunde uma bacia de barbeiro com um elmo de ouro, além de outras maluquices.

  • Em suas andanças, ele e seu escudeiro são alvo de zombaria, mas também ouvem a história de alguns personagens que encontram.

  • O romance é longo e repleto de diálogos, muitas vezes cômicos, entre Dom Quixote e Sancho Pança.

  • O livro é composto por vários episódios, protagonizados por Dom Quixote e Sancho Pança.

Quem foi Dom Quixote?

Dom Quixote é um personagem fictício, fascinado por romances de cavalaria. Tais histórias seriam o motivo de sua loucura.

Dom Quixote não existiu, ele é um personagem fictício do escritor espanhol Miguel de Cervantes. O herói ou anti-herói (já que imperfeito) da obra era um fidalgo espanhol, o qual era fascinado por romances de cavalaria. Tais livros foram muito populares nas primeiras décadas do século XVI, na Espanha.

O personagem vivia em uma aldeia da Mancha (região espanhola), tinha quase 50 anos e, segundo o narrador:

ele se embrenhou tanto na leitura que passava as noites lendo até clarear e os dias até escurecer; e assim, por dormir pouco e ler muito, secou-lhe o cérebro de maneira que veio a perder o juízo. Sua imaginação se encheu de tudo aquilo que lia nos livros, tanto de encantamentos como de duelos, batalhas, desafios, feridas, galanteios, amores, tempestades e disparates impossíveis; e se assentou de tal modo em sua mente que todo aquele amontoado de invenções fantasiosas parecia verdadeiro: para ele não havia outra história mais certa no mundo. [...]

Desse modo, o fidalgo enlouqueceu:

[...], acabado seu juízo, foi dar no mais estranho pensamento em que jamais caiu louco algum: pareceu-lhe conveniente e necessário, tanto para o engrandecimento de sua honra como para o proveito de sua pátria, se fazer cavaleiro andante e ir pelo mundo com suas armas e cavalo em busca de aventuras e para se exercitar em tudo aquilo que havia lido que os cavaleiros andantes se exercitavam, desfazendo todo tipo de afrontas e se pondo em situações e perigos pelos quais, superando-os, ganhasse nome eterno e fama. O pobre já se imaginava coroado pelo valor de seu braço com pelo menos o império de Trebizonda; e assim, com pensamentos tão agradáveis, levado pelo singular prazer que neles sentia, se apressou em realizar o que desejava.

Contudo, existe a hipótese de que esse famoso personagem de Cervantes tenha sido inspirado no fidalgo Dom Alonso Quijada de Salazar, parente de Catalina de Salazar y Palácios (1565-1626), esposa do autor.

Análise da obra Dom Quixote

Personagens da obra Dom Quixote

A seguir, os principais personagens que aparecem nos episódios narrados em Dom Quixote, seja na história do protagonista, seja em alguma história contada por outro personagem:

  • Alonso López: licenciado ou bacharel.

  • Altisidora: uma aia.

  • Ambrósio: amigo de Grisóstomo.

  • Ana Félix: uma mourisca cristã.

  • Angélica: bela donzela.

  • Anselmo: cavalheiro de Florença.

  • Camila: esposa de Anselmo.

  • Cardênio: cavaleiro ou o Cavaleiro da Floresta.

  • Clara Viedma: filha do ouvidor.

  • Cláudia Jerônima: dama.

  • Cônego: um religioso.

  • Dom Álvaro Tarfe: cavaleiro.

  • Dom Antônio Moreno: cavaleiro rico.

  • Dom Diego de Miranda: fidalgo.

  • Dom Gaspar Gregório: filho de um cavaleiro.

  • Dom Luís: cavaleiro.

  • Dom Quixote ou Alonso Quixano: protagonista.

  • Dom Vicente: fidalgo.

  • Dona Rodríguez: ama da duquesa.

  • Doroteia: filha do rico Clenardo.

  • Dulcineia: amada do protagonista.

  • Estalajadeira.

  • Estalajadeiro.

  • Eugênio: pastor.

  • Fernando: filho de um duque.

  • Grisóstomo: pastor.

  • Lotário: cavalheiro de Florença.

  • Lucinda: donzela, amada por Cardênio.

  • Marcela: pastora, amada de Grisóstomo.

  • Maritornes: uma asturiana.

  • Medoro: um mouro.

  • Mestre Nicolás: o barbeiro.

  • Mestre Pedro: famoso titereiro.

  • Padre: amigo de Dom Quixote.

  • Pedro Recio: um doutor.

  • Ricote: um mourisco.

  • Rocinante: cavalo de Dom Quixote.

  • Roland: cavaleiro andante.

  • Roque Guinart: cavaleiro.

  • Sancho Pança: escudeiro de Dom Quixote.

  • Sansão Carrasco: bacharel.

  • Teresa Pança: esposa de Sancho.

  • Tomé Cecial: escudeiro.

  • Tosilos: lacaio do duque.

  • Trifaldi: condessa.

  • Trifaldin da Barba Branca: escudeiro da condessa Trifaldi.

  • Vivaldo: fidalgo.

  • Zoraida: uma moura.

Tempo da obra Dom Quixote

A narrativa de Dom Quixote apresenta tempo cronológico. A história narrada se passa, ao que tudo indica, no século XVI.

Espaço da obra Dom Quixote

O espaço da narrativa é a região da Mancha e outras localidades da Espanha.

Enredo da obra Dom Quixote

A obra é composta por vários episódios, que narram as aventuras ou desventuras do protagonista. Na primeira parte da obra, o narrador apresenta Dom Quixote, o qual, após perder o juízo, se torna um cavaleiro andante. Para isso, usa uma velha armadura que foi de seus bisavós e monta em um pangaré com “os cascos mais rachados que os calcanhares de um camponês”, ao qual chama de Rocinante.

Como todo cavaleiro, precisa se apaixonar por uma dama e se lembra de

que havia numa aldeia perto da sua, pelo que se pensa, uma camponesa de muito boa aparência por quem ele andou apaixonado um tempo, embora se acredite que ela jamais tenha sabido disso nem o tenha deixado provar de sua formosura. Chamava-se Aldonza Lorenzo, e ele achou bom lhe dar o título de senhora de seus pensamentos; e, procurando um nome que não destoasse muito do seu e insinuasse ou parecesse nome de princesa e grande senhora, veio a chamá-la “Dulcineia del Toboso”, porque era natural de El Toboso.

Dom Quixote é ridicularizado em uma estalagem quando percebem que ele é louco. Na estrada, entra em conflito com mercadores e é espancado por um servo deles. Em sua casa, enquanto o fidalgo está dormindo, o padre e o barbeiro vão examinar a sua biblioteca. A chave desse aposento foi dada ao padre pela sobrinha de Dom Quixote.

O padre escolhe os livros que devem ser queimados, já que, segundo ele, são a causa da loucura do fidalgo. Dom Quixote está em casa há 15 dias quando manda chamar um camponês vizinho seu e o convence, com promessas de riqueza, a ser seu escudeiro. Seu nome é Sancho Pança, o qual, montado em um jumento, deixa esposa e filhos para acompanhar o louco cavaleiro andante.

Dom Quixote e Sancho Pança avistam 30 ou 40 moinhos de vento, sobre os quais diz o fidalgo:

O acaso vai guiando nossas coisas melhor do que poderíamos desejar: olha lá, amigo Sancho Pança, onde estão uns trinta gigantes monstruosos, com quem penso travar batalha e a todos tirar as vidas. Com os despojos deles começaremos a enriquecer, que esta guerra é boa, e grande serviço presta a Deus quem varre da face da terra semente tão maligna.

O cavaleiro luta contra um valente basco e passa uma noite em companhia de pastores de cabras. Ao saber que o pastor Crisóstomo morreu por sua amada, Marcela, o fidalgo vai assistir ao enterro do rapaz. Dom Quixote e seu escudeiro se hospedam em uma estalagem, mas o fidalgo confunde o lugar com um castelo e seus hóspedes com nobres. Nesse lugar, Sancho Pança é humilhado, e Dom Quixote encontra explicações mágicas para o ocorrido:

Agora sim me convenci, meu bom Sancho, de que aquele castelo ou estalagem é encantado, pois o que poderiam ser aqueles que tão atrozmente se divertiram contigo senão fantasmas e gente do outro mundo? A prova disso é que, quando eu estava assistindo aos atos de tua triste tragédia por cima do muro do pátio, não pude subir nele, nem mesmo apear de Rocinante, porque deviam ter me encantado. Se eu pudesse subir, ou apear-me, juro que teria te vingado e de tal maneira que aqueles patifes e canalhas se lembrariam da travessura para sempre, mesmo sabendo que nisso contrariava as leis da cavalaria, que, como já te disse muitas vezes, não consentem que um cavaleiro levante a mão contra quem não o seja, exceto em defesa da própria vida e pessoa, em caso de urgente e grande necessidade.

Encontram o licenciado Alonso López, que leva os ossos de um cavalheiro para uma sepultura em Segóvia, morto por “febres pestilentas”. Sancho chama Dom Quixote de Cavaleiro da Triste Figura. Dom Quixote exige a posse de um suposto elmo de ouro, que não passa de uma bacia de latão de um barbeiro, o qual, por causa da chuva “botou na cabeça a bacia que, como estava limpa, reluzia a meia légua”.

Entremeados à ação do romance, há diálogos extensos entre os personagens, principalmente entre Dom Quixote e Sancho, além de se contarem histórias. Os dois vivem aventuras na serra morena, onde o padre e o barbeiro tentam convencer o fidalgo a voltar para casa, sem sucesso. Cavaleiro e escudeiro voltam à estalagem que Dom Quixote achava ser um castelo. Ali o padre lê para todos a história do “curioso impertinente”, e sua leitura é reproduzida pelo narrador.

Dom Quixote e seu fiel escudeiro, Sancho Pança.

Na estalagem, Dom Quixote faz um longo discurso sobre as armas e as letras. Em seguida, o Cativo, um hóspede da estalagem, conta a história de sua vida. Ainda na estalagem, Dom Quixote briga com um quadrilheiro. Padre e barbeiro conseguem enganar o fidalgo e o levam enjaulado para casa.

No caminho, encontram o cônego, e o padre conversa bastante com ele, principalmente sobre livros de cavalaria. Em certo ponto do caminho, Dom Quixote é libertado, e Sancho promete ao padre que o fidalgo não vai fugir. O Cavaleiro da Triste Figura conversa bastante com o cônego. Ouve também a história do pastor Eugênio, mas acaba brigando com ele, depois que Eugênio diz que: “este gentil-homem tem vazios os aposentos da cabeça”.

Ao que Dom Quixote contesta: “Patife miserável! [...] Vazio e covarde sois vós, pois eu estou mais cheio do que jamais esteve a puta de merda que vos pariu”. Então, “agarrou um pão que estava perto e deu com ele na cara do pastor, com tanta fúria que lhe achatou o nariz”.

Já na segunda parte da obra, Dom Quixote está de volta à sua casa e faz quase um mês que o padre e o barbeiro não o visitam, mas visitam a sobrinha do fidalgo e sua criada para pedir que cuidem bem de Dom Quixote. Então ocorre uma confusão envolvendo a sobrinha, a criada e Sancho Pança.

Isso porque Sancho quer ver Dom Quixote, mas essas mulheres não deixam, e a criada o acusa: “pois sois vós e não outro quem alicia e desencaminha meu senhor e o arrasta pelos quintos dos infernos”. Em seguida, Dom Quixote e Sancho Pança têm uma longa conversa com o bacharel Sansão Carrasco.

Aqui é bom informar que as conversas entre os personagens em toda a obra consistem em histórias, questionamentos ou debates muitas vezes cômicos. O narrador reproduz uma longa conversa entre Sancho e sua esposa. Enquanto isso, a sobrinha e a criada começam a desconfiar de que Dom Quixote pretende fugir novamente para a “andante cavalaria”.

Dom Quixote e Sancho se dirigem à cidade de Toboso, com intuito de ver Dulcineia, a dama amada pelo Cavaleiro da Triste Figura. Ali Dom Quixote vê uma camponesa desconhecida e a trata como a nobre Dulcineia. Depois, encontram um tal Cavaleiro da Floresta, que conta uma longa história a Dom Quixote.

Ao ver um homem que está levando dois leões enjaulados como presente à Sua Majestade, Dom Quixote, em busca de aventura, manda o tratador abrir a jaula. Quando a primeira jaula é aberta, o leão ignora Dom Quixote dando as costas para ele. O cavaleiro e seu fiel escudeiro continuam o caminho e encontram outros personagens, com quem conversam e de quem ouvem histórias.

Dom Quixote fala de uma suposta e fantástica aventura na caverna de Montesinos. No rio Ebro, o Cavaleiro da Triste Figura “viu um pequeno barco sem remo nem mastros ou velas, que estava amarrado ao tronco de uma árvore na margem”. Ele diz para Sancho que o “barco atracado aqui está, claramente e sem que nada possa evitar, me chamando e me convidando a entrar nele para ir em socorro de algum cavaleiro ou de alguma outra pessoa importante que deve estar numa grande aflição”.

O resultado dessa travessia e das inevitáveis loucuras de Dom Quixote é o seguinte:

Aí chegaram os pescadores donos do barco, que as rodas dos moinhos tinham feito em pedaços. Vendo-o em lascas, trataram de despir Sancho e pedir a dom Quixote que o pagasse. Ele, com muita calma, como se não tivesse acontecido nada demais, disse aos moleiros e pescadores que ele pagaria o barco com muita boa vontade, com a condição de que lhe entregassem livre e sem resgate a pessoa ou pessoas que mantinham presas naquele castelo.

Por fim, os “pescadores e moleiros estavam pasmos, olhando aquelas duas figuras tão diferentes dos outros homens, e não conseguiam entender as alegações e perguntas de dom Quixote; e, tendo-os por loucos, os deixaram”. O romance segue com mais episódios, compostos por acontecimentos, histórias e diálogos.

Em novo episódio, um duque e uma duquesa se divertem com a loucura de Dom Quixote e a ingenuidade de Sancho Pança. Os duques decidem pregar uma peça em Sancho: “tendo explicado o plano e dado as ordens que seus criados e vassalos deviam seguir com Sancho no governo da ilha prometida, [...], o duque disse a Sancho que se aprontasse e se arrumasse para ir ser governador, pois seus ilhéus já o estavam esperando como à água depois da seca”.

Aqui é importante mencionar que, quando Dom Quixote, no início da obra, buscava convencer Sancho Pança a ser seu escudeiro, disse que talvez ele acabasse dono de alguma ilha, o que se tornou um sonho de Sancho. Daí a relevância da enganação perpetrada pelo duque:

Digo, então, que Sancho chegou com todo o seu séquito a uma aldeia de uns mil moradores, que era das melhores que o duque tinha. Disseram a ele que se chamava ilha Logratária, porque o lugar se chamava Logradouro ou porque aquele governo tinha alguma coisa não muito limpa. Ao chegar às portas da aldeia, que era cercada por uma muralha, saiu o conselho municipal para recebê-lo, tocaram os sinos e todos os moradores deram mostras de alegria geral e com muita pompa o levaram à catedral para agradecer a Deus. Depois, com algumas cerimônias ridículas, lhe entregaram as chaves do povoado e o aceitaram como governador perpétuo da ilha Logratária.

Assim, deixam Sancho governar a suposta ilha, enquanto o “administrador, [estava] ocupado em escrever a seus senhores o que Sancho Pança dizia e fazia, tão surpreso com seus feitos como com seus ditos, porque suas palavras e suas ações andavam misturadas, com sinais de sabedoria e de tolice”.

O governo de Sancho termina quando mais de 20 pessoas o chamam para lutar: “Às armas, às armas, senhor governador! Depressa, que inúmeros inimigos entraram na ilha! Estaremos perdidos se vossa argúcia e coragem não nos socorrerem!”. Dessa forma, seu governo dura apenas 10 dias.

Por fim, Dom Quixote e Sancho Pança se despedem dos duques, deixam o castelo e retornam à estrada rumo a Barcelona. No caminho, juntam-se a um tal Roque e mais seis escudeiros. Dom Quixote e Sancho se hospedam na casa do rico cavaleiro Dom Antônio Moreno, o qual “andava procurando modos de, sem prejudicá-lo, revelar a todos suas loucuras, [...]”.

Depois, Dom Quixote e seu escudeiro saem de Barcelona, e Dom Quixote planeja virar pastor:

Este é o campo onde topamos com aquelas pastorinhas encantadoras e aqueles pastores galantes que queriam imitar e reconstruir a Arcádia pastoral, ideia tão original como sábia, que eu gostaria de seguir, Sancho, se te agradar, transformando-nos em pastores, ao menos pelo tempo de meu retiro. Sim, comprarei algumas ovelhas e todas as demais coisas que são necessárias ao ofício pastoril. Eu me chamarei “pastor Quixótis”, tu “pastor Pancino”, e andaremos pelas montanhas, pelas selvas e pelos campos, cantando aqui, declamando ali, bebendo nas fontes cristalinas ou nos riachos límpidos ou nos rios caudalosos.

Por fim, os dois voltam para a sua aldeia na Mancha, e a história chega ao fim quando Dom Quixote adoece e morre:

Como as coisas humanas não são eternas, mas um declínio constante do começo até seu derradeiro fim, especialmente as vidas dos homens, e como a de dom Quixote não tivesse o privilégio do céu para deter o curso do declínio da sua, chegou o fim e desfecho dela quando ele menos esperava. Fosse pela melancolia que lhe causava se ver vencido, ou pela disposição do céu, que assim o ordenava, foi tomado por uma febre que o deixou seis dias de cama. Nesse meio-tempo, recebeu muitas vezes a visita do padre, do bacharel e do barbeiro, seus amigos, sem que seu bom escudeiro Sancho Pança saísse da cabeceira.

Narrador da obra Dom Quixote

A obra conta com um irônico narrador onisciente, aquele que tudo sabe acerca da história e do destino dos personagens, além de conhecer seus pensamentos e anseios mais íntimos.

Veja também: Quais são os elementos fundamentais de uma narrativa?

Características da obra Dom Quixote

Estrutura da obra Dom Quixote

Dom Quixote é um extenso romance. A primeira parte apresenta um prólogo e 52 capítulos. Já a segunda parte, um prólogo e 74 capítulos.

Estilo literário da obra Dom Quixote

O estilo do romance de Cervantes é o maneirismo, que consiste em uma transição entre o classicismo e o barroco. O maneirismo é associado ao exagero, ao humor e à ironia. A obra Dom Quixote está inserida no que se convencionou chamar de Século de Ouro da literatura espanhola, período compreendido entre os séculos XVI e XVII, marcado por contrastes, além de crise sociopolítica e de valores. Nesse período, há o questionamento acerca da realidade e do conhecimento.

Foco narrativo da obra Dom Quixote

O romance é narrado da perspectiva de um narrador onisciente, ou seja, um narrador em terceira pessoa, que não participa da história.

O que Dom Quixote defendia?

Como os cavaleiros medievais, Dom Quixote defende a honra, a glória, o amor e a fé cristã, mas por uma perspectiva insana e cômica.

Moral da história de Dom Quixote

A moral da história de Dom Quixote vai depender da interpretação de cada leitor e leitora. Afinal, uma obra tão extensa e complexa não pode ser reduzida a uma simples moral. Assim, a depender de cada interpretação, pode-se concluir que a vida não passa de uma ilusão, ou que os heróis não têm lugar no mundo moderno, ou, ainda, que a verdade depende dos olhos de quem vê. Enfim, leia a obra e tire suas próprias conclusões.

Por que a obra Dom Quixote é tão famosa?

A fama de Dom Quixote começou na Espanha, no ano de sua primeira publicação, em 1605. O romance caiu no gosto do público, de forma a se transformar em um fenômeno literário e cultural. Já no meio acadêmico, sua importância se deve ao fato de que tal obra é considerada pela crítica especializada como o primeiro romance moderno.

Contexto histórico de Dom Quixote

No século XVI, a Espanha foi governada pela dinastia Habsburgo. Carlos I (1500-1558) fortaleceu a colonização na América e entrou em guerra contra a França. Felipe II (1527-1598) sucedeu o pai em 1556 e manteve a expansão do Império Espanhol. Durante seu reinado, a cultura espanhola se desenvolveu, dando início ao Século de Ouro.

Seu reinado foi marcado por conflitos contra muçulmanos (mouriscos), na defesa da fé católica. Fato importante foi a Batalha de Lepanto, ocorrida em 1571, em que a Liga Santa, da qual faziam parte vários países católicos, derrotou o Império Otomano. Cervantes participou dessa batalha.

Nesse contexto de valorização da cultura, mas também de luta contra aqueles que ameaçavam a fé católica, nasceu o personagem Dom Quixote de la Mancha. Em sua loucura, ele luta contra grandes inimigos medievais, porém seu heroísmo é ridicularizado pelo narrador cervantino.

Saiba mais: 30 clássicos da literatura que foram adaptados para o cinema

Filmes sobre Dom Quixote

Os pesquisadores João Eduardo Hidalgo e Maria Arminda do Nascimento Arruda listaram 41 adaptações de Dom Quixote para o audiovisual. No quadro abaixo, apontamos algumas dessas adaptações para o cinema.

TÍTULO

PAÍS

ANO

Dom Quixote

França

1898

Aventuras de Dom Quixote de la Mancha

França

1903

Dom Quixote

Espanha

1908

Dom Quixote

[direção de Emile Cohl]

França

1909

Dom Quixote

[direção de Georges Méliès]

França

1909

Senhor Dom Quixote

França

1909

Dom Quixote

Itália

1910

Dom Quixote

França

1912

Dom Quixote

Estados Unidos

1915

O sonho de Dom Quixote

Itália

1915

Dom Quixote

Inglaterra

1923

Dom Quixote

Espanha/Dinamarca

1926

Dom Quixote

França/Inglaterra

1933

Dom Quixote

[animação]

Estados Unidos

1934

Dulcineia

Espanha

1947

Dom Quixote de la Mancha

Espanha

1947

O curioso impertinente

Espanha

1948

Dom Quixote

Estados Unidos/Espanha

1955

Dan Quihote V’Sa’adia Pansa

Israel

1956

Dom Quixote

União Soviética

1957

Dom Quixote

França

1965

O homem da Mancha

Estados Unidos

1972

As aventuras de Dom Quixote

Inglaterra

1973

Perdido na Mancha

Inglaterra/Espanha

2002

Honra da cavalaria

Espanha

2006

DonKey Xote

[animação]

Espanha

2007

Dom Quixote

Estados Unidos

2015

O homem que matou Dom Quixote

Espanha/Inglaterra/Itália/Portugal/França

2018

Miguel de Cervantes, autor de Dom Quixote

O escritor espanhol Miguel de Cervantes, em pintura de Juan de Jáuregui (1583-1641).

Miguel de Cervantes Saavedra nasceu em 29 de setembro de 1547, em Alcalá de Henares, na Espanha. Mais tarde, prestou serviço militar na Itália em 1970. Lutou em algumas batalhas como soldado. Capturado por piratas, em 1575, foi escravizado em Argel, até ser libertado em 1580.

Viveu uma vida atribulada, com dificuldades financeiras. O primeiro sucesso como escritor ocorreu em 1605, quando publicou Dom Quixote. O autor faleceu em 22 de abril de 1616, em Madri, na Espanha. E se tornou o mais famoso escritor espanhol no mundo inteiro.

Crédito da imagem

[1] Editora Antofágica (reprodução)

Fontes

CERVANTES, Miguel de. Dom Quixote de la Mancha. Tradução de Ernani Ssó. São Paulo: Companhia das Letras, 2012.

CONTRERA, Ximena León. Circulação dos mouriscos após a deportação do reino de Granada (1570). Tempo, Niterói, v. 28, n. 2, maio/ ago. 2022. 

FINE, Ruth. La figura del cruce em el Quijote: posible cifra de um manierismo literário. Disponível em: https://www.cervantesvirtual.com/obra/la-figura-del-cruce-en-el-quijote--posible-cifra-de-un-manierismo-literario/.

GALERÍA DE LAS COLECCIONES REALES. Felipe II. Disponível em: https://www.galeriadelascoleccionesreales.es/monarca/felipe-ii/5e19e366-63da-dbc3-f3e9-ed1b257a211c.

HIDALGO, João Eduardo; ARRUDA, Maria Arminda do Nascimento. Dom Quixote no cinema: o cavaleiro da triste figura e sua imagem. In: SILVA, Marcelo da Fonseca Ferreira da; ALMEIDA, Flávio Aparecido de (orgs.). Ciências humanas e sociais: tópicos atuais em pesquisa. Guarujá: Científica digital, 2023. v. 3.

OLIVEIRA, Manoela Hoffmann. Dom Quixote como o primeiro romance moderno. In: CONGRESSO INTERNACIONAL DA ABRALIC, 11., 2008, São Paulo. Anais [...]. São Paulo: ABRALIC, 2008.

RUTHERFORD, John. Introdução. In: CERVANTES, Miguel de. Dom Quixote de la Mancha. Tradução de Ernani Ssó. São Paulo: Companhia das Letras, 2012.  

Gostaria de fazer a referência deste texto em um trabalho escolar ou acadêmico? Veja:

SOUZA, Warley. "Dom Quixote"; Brasil Escola. Disponível em: https://brasilescola.uol.com.br/literatura/dom-quixote.htm. Acesso em 01 de abril de 2025.

De estudante para estudante