Lei dos Sexagenários

Lei dos Sexagenários, de 1885, foi uma das leis abolicionistas aprovadas no Brasil antes da abolição. Ela determinou que escravos com 60 anos ou mais seriam libertos.

A atuação do movimento abolicionista e a resistência escrava ganharam força no Brasil a partir da década de 1870.

A Lei dos Sexagenários foi uma das leis aprovadas no Brasil com o intuito de promover a abolição do trabalho escravo de maneira lenta. Ela foi proposta por Manuel Dantas, reformada por Antônio Saraiva e aprovada pelo Barão de Cotegipe, em 1885. Determinava que escravos com mais de 60 anos seriam considerados livres.

A lei foi uma resposta dos conservadores ao avanço da pauta abolicionista na sociedade brasileira. Sua aprovação foi considerada uma derrota para os defensores da abolição e entendida como uma medida dos conservadores para barrar o avanço desse movimento no Brasil. A lei, no entanto, não impediu que a abolição acontecesse, em 1888.

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Contexto histórico da Lei dos Sexagenários

O grande debate na política brasileira do século XIX envolveu a abolição do trabalho escravo. Esse debate aconteceu em etapas muito lentas e sempre se esbarrava no conservadorismo dos políticos, representantes dos interesses dos grandes fazendeiros donos de dezenas de escravos. Além daqueles que internamente defendiam a abolição, havia o fato de o Brasil ser um dos últimos países no mundo a utilizar a mão de obra de negros escravizados, o que trazia pressão internacional sobre o país para que a abolição acontecesse.

A primeira parte do debate esteve relacionada com a proibição do tráfico negreiro, e depois que o tráfico foi proibido, a defesa da abolição começou a ganhar força, mas foi barrada pelo gradualismo implantado (pelo fazer-se pouco a pouco). Por conta disso, aprovou-se a Lei do Ventre Livre, em 1871, que contribuiu para enfraquecer temporariamente o cenário de luta contra a escravidão.

Entretanto, a partir de 1878, o debate pela abolição retomou sua força motivado pela aproximação dos oito anos de aprovação da Lei do Ventre Livre. Assim, o Brasil pôde ver os primeiros filhos de escravas sendo libertados de acordo com o que estabelecia essa lei. O movimento abolicionista então começou a agir interna e externamente para que o fim do trabalho escravo avançasse.

Nomes como Joaquim Nabuco e José do Patrocínio agitaram a sociedade promovendo o debate abolicionista. Essa nova mobilização fez com que uma série de instituições abolicionistas fossem criadas no Brasil, com destaque para a Associação Central Emancipadora, a Sociedade Brasileira contra a Escravidão e a Confederação Abolicionista.

Esse recrudescimento do abolicionismo foi acompanhado por uma reação conservadora que fez com que, no Parlamento, os debates sobre a abolição fossem barrados, e na sociedade, a presença de instituições de escravocratas fossem ampliada. Ainda assim, a defesa da abolição avançou em todo o Brasil.

Manifestações públicas ocorriam, panfletos e jornais em defesa da causa circulavam pelas grandes cidades, e a campanha abolicionista resultou na abolição do trabalho escravo em dois estados brasileiros. Assim, em 1884, Ceará e Amazonas declararam que a escravidão estava definitivamente extinta em seus territórios.

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Reforma Dantas

A proposta de Dantas procurava acabar com a escravidão no Brasil em até 16 anos.

Essa disputa entre abolicionistas e escravocratas repetia-se nos meios políticos, e, em 1884, os liberais e defensores da abolição tiveram a possibilidade de levar esse debate adiante na política. Nesse ano, o presidente do Conselho de Ministros (correspondente ao que conhecemos como primeiro-ministro), Manuel Pinto de Sousa Dantas, apresentou no Parlamento uma proposta de reforma da escravidão.

A proposta de Dantas trazia as seguintes questões, segundo a historiadora Ângela Alonso|1|:

  • Propunha abolir a escravidão no Brasil de maneira definitiva em até 16 anos;

  • Libertava os escravos com mais de 60 anos;

  • Reorganizava a tabela de preços de escravos;

  • Proibia o tráfico interprovincial;

  • Permitia a distribuição de pequenas terras para ex-escravos;

  • Anulava as matrículas irregulares de escravos.

Essa proposta foi encarada com muita resistência pelos parlamentares, sobretudo porque não estipulava o pagamento de indenização para os senhores que tivessem os seus escravos libertos por ela. A reação conservadora foi tão forte que novas eleições foram realizadas para compor o Parlamento e, para o desagrado de Dantas, a maioria eleita foi conservadora.

Para resolver a disputa política, o imperador decidiu trocar o presidente do Conselho de Ministros. Antônio Saraiva, e depois o Barão de Cotegipe, assumiu o posto enquanto a proposta de Dantas era debatida, e depois que Dantas saiu da presidência do gabinete, seu projeto passou por modificações.

As modificações realizadas no gabinete de Saraiva foram apresentadas em 12 de maio de 1885 e estabeleceram uma indenização para os senhores de escravos que seria feita de acordo com o tempo de trabalho, além disso, o preço dos escravos foi reajustado e aumentado em relação à proposta de Dantas. As alterações de Saraiva foram criticadas pelos abolicionistas, que adotaram uma retórica mais radical.

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Lei dos Sexagenários

O Barão de Cotegipe liderou o Parlamento para aprovar a Lei dos Sexagenários em setembro de 1885.[1]

As críticas dos liberais e abolicionistas a Saraiva fizeram com que ele abandonasse o gabinete, e d. Pedro II escolheu o Barão de Cotegipe para a função. Este era um político conservador e defensor da escravidão e, nessa função, deu sequência à proposta de Saraiva como forma de silenciar o discurso dos abolicionistas cada vez mais radical.

Cotegipe, em seu esforço para conter os abolicionistas, autorizou a polícia a agir com truculência contra suas manifestações e mobilizou-a para capturar escravos que fugiam. O objetivo era enfraquecer o movimento no Brasil. Ele ainda deu sequência à tramitação da proposta de Saraiva, não a alterando e conseguindo sua aprovação em 28 de setembro de 1885.

Com isso, foi promulgada a Lei nº 3.270, também conhecida como Lei dos Sexagenários ou Lei Saraiva-Cotegipe. Por meio dela decretou-se que:

  • Escravos com mais de 60 anos seriam considerados livres;

  • Como indenização, os sexagenários escravizados deveriam trabalhar para os seus senhores por três anos (com os 65 anos sendo a idade limite);

  • Sexagenários libertos deveriam continuar morando com seus senhores e só poderiam mudar-se se um juiz de órfãos os autorizasse;

  • Sexagenários libertos seriam obrigados a morar na cidade onde foram alforriados por cinco anos (exceto para as capitais);

  • Preços altos seriam estabelecidos para que os escravos fossem alforriados;

  • Tráfico interprovincial seria proibido etc.

A Lei dos Sexagenários foi considerada uma vitória dos conservadores. Primeiro porque tinha sido aprovada sem os itens mais incisivos originalmente propostos por Manuel Dantas. Segundo porque a sua aprovação procurava enfraquecer a retórica abolicionista que adotava propostas cada vez mais radicais.

Apesar disso, a Lei dos Sexagenários fracassou. Tendo em vista enfraquecer o abolicionismo, ela não obteve sucesso porque o movimento continuou ganhando força no Brasil e as ações de resistência contra a escravidão, pacíficas ou não pacíficas, continuaram aumentando.

O fracasso conservador ficou mais perceptível ainda porque, menos de três anos depois da aprovação da Lei dos Sexagenários, a abolição do trabalho escravo foi decretada pela Lei Áurea, de 13 de maio de 1888.

Nota

|1| ALONSO, Ângela. Processos políticos da abolição. In.: SCHWARCZ, Lilia Moritz e GOMES, Flávio (orgs.). Dicionário da escravidão e liberdade. São Paulo: Companhia das Letras, 2018. p. 361.

Créditos da imagem

[1] Commons

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SILVA, Daniel Neves. "Lei dos Sexagenários"; Brasil Escola. Disponível em: https://brasilescola.uol.com.br/historiab/lei-dos-sexagenarios.htm. Acesso em 29 de abril de 2024.

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