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Protestos contra o aumento das tarifas, uma nova ação política?

Os protestos contra o aumento da tarifa do transporte coletivo abriram uma nova possibilidade de atuação política no Brasil, agregando novas reivindicações e grupos sociais.

O hábito de tapar os rostos é uma forma de preservar a identidade nas manifestações, seja no Brasil ou em Londres, como indica a foto.*
O hábito de tapar os rostos é uma forma de preservar a identidade nas manifestações, seja no Brasil ou em Londres, como indica a foto.*
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No mês de junho de 2013, várias cidades do Brasil presenciaram uma crescente onda de protestos que tiveram por origem reivindicações contra o aumento das tarifas do transporte coletivo. No dia 17 de junho, mais de 250 mil pessoas saíram às ruas de 11 capitais brasileiras e de outras cidades em uma onda de manifestação popular que não se via no país desde as manifestações pelo impeachment de Fernando Collor de Mello, em 1992. No exterior, mais de duas dezenas de cidades tiveram manifestações em solidariedade às ações que ocorreram no Brasil.

Apesar de ter como reivindicação inicial a revogação dos aumentos das tarifas do transporte público, a pauta de reivindicação ampliou-se, abarcando também a violenta repressão policial, os gastos do Brasil com os eventos esportivos (como a Copa do Mundo de 2014 e as Olimpíadas), bem como as reivindicações mais genéricas e sem apontamentos mais concretos nas resoluções dos problemas, como a luta contra a corrupção e melhorias nos sistemas de saúde e educação.

Surgiu também nos dias anteriores a 17 de junho uma onda de nacionalismo, propagado principalmente pelas redes sociais da internet, em que se dizia que o Brasil, o gigante adormecido, havia acordado. Com frases evocando trechos do Hino Nacional, como “verás que um filho teu não foge à luta”, seus divulgadores pretendiam indicar que se iniciava um novo momento de participação política da população brasileira, cujo objetivo seria, em termos gerais, a reconstrução de um novo país.

Como este texto foi escrito um dia após as manifestações de 17 de junho de 2013, é impossível apontar caminhos claros para as manifestações que ocorreram. Porém, é possível indicar um histórico das lutas que deram início às manifestações, bem como levantar os motivos que levaram ao aparecimento das novas reivindicações.

A origem das manifestações esteve na reivindicação da revogação dos aumentos das tarifas do transporte público que ocorreram em diversas cidades do Brasil. Desde finais do século XIX – com a Revolta do Vintém, no Rio de Janeiro –, manifestações ocorrem nas cidades brasileiras tanto contra os altos preços das tarifas quanto pela péssima qualidade oferecida nesse serviço público essencial. Na metade da década de 2000, nas cidades de Salvador e Florianópolis, surgiram manifestações contra o aumento do preço do transporte coletivo, que durante dias pararam o trânsito e conseguiram que os aumentos fossem revogados.

A partir dessas manifestações, os grupos participantes conseguiram criar durante a realização do Fórum Social Mundial de Porto Alegre, em 2005, o Movimento Passe Livre (MPL), que foi constituído em mais de uma dezena de cidades do Brasil. Esses grupos passaram a discutir sobre a situação do transporte público em suas cidades e no Brasil como um todo, resultando no questionamento tanto do valor cobrado pelo serviço quanto do modelo de transporte público adotado no Brasil. Outro ponto discutido é a forma de gestão, se atende a interesses privados de empresas ou à garantia de direitos sociais básicos.

Nesse sentido, as manifestações que se iniciam contra o aumento das tarifas passam também a questionar o modelo de transporte público adotado nas cidades. Em 2013, a primeira manifestação ocorreu em Porto Alegre, em março, tendo como conquista do movimento a suspensão temporária da cobrança do novo preço estipulado, após intervenção do poder judiciário. Em Goiânia, em junho, a Frente de Luta contra o Aumento conseguiu também uma suspensão temporária da nova tarifa após intervenção do Procon e Poder Judiciário. Em Natal, após algumas manifestações, o prefeito determinou a redução da tarifa, argumentando que o fez em razão da redução das alíquotas do PIS e da Cofins sobre os insumos do transporte coletivo, que passaram a vigorar em 1º de junho.

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Mas as manifestações passaram a ganhar uma maior amplitude após iniciados os atos de rua organizados pelo MPL-SP. Posicionando-se contra o aumento da tarifa em São Paulo, o movimento reivindica ainda uma nova proposta de tarifação do transporte coletivo, a tarifa zero, que não seja paga diretamente pelo usuário, situação que ocorre com outros serviços públicos, como a educação e coleta de lixo. Os atos que começaram com cerca de 5 mil pessoas chegaram a seu ápice em 17 de junho, quando mais de 70 mil pessoas saíram às ruas da capital paulista para pedir a revogação do aumento. Outras cidades passaram também a se manifestar contra o aumento, como Rio de Janeiro, que chegou a reunir mais de 100 mil pessoas nas ruas.

Mas a repressão policial levantou também outras discussões, como a violência nas manifestações e a criminalização dos movimentos sociais. A criminalização dos movimentos sociais é percebida pelos manifestantes quando a polícia tenta enquadrar alguns participantes em uma ação de formação de quadrilha, indicando que, para a polícia, organizar-se politicamente de uma forma que fuja dos parâmetros tradicionais constitui crime. Ou mesmo o fato de portarem frascos de vinagre para amenizar os efeitos do gás lacrimogênio, que foi tomado como motivo de detenção de manifestantes por policiais. Essa situação, inclusive, fez com que as manifestações ganhassem também a alcunha de Revolta do Vinagre.

No que se refere à violência, críticas são direcionados tanto aos manifestantes, acusados de atos de vandalismo, quanto às forças policiais, acusadas de ações desproporcionais de força e também de ataque direto a manifestantes e jornalistas. Essa violência da polícia fez, inclusive, que os principais meios de comunicação do país deixassem de atacar diretamente as manifestações – como fizeram quando apontaram ações depredatórias nos atos – e passassem a defender a liberdade de atuação política.

Essa mudança dos meios de comunicação foi acompanhada de uma ampliação das pautas de reivindicação, incluindo questões que não as ligadas ao transporte público. Posicionamentos contra a corrupção, melhorias nos sistemas de educação e saúde, bem como a defesa da função investigativa do Ministério Público (que está ameaçada através do Projeto de Emenda Constitucional nº 37, PEC 37) estão sendo levantadas.

Essas são pautas em que não há consenso sobre sua defesa entre os movimentos que iniciaram as manifestações relacionadas ao transporte. Por um lado, movimentos como o MPL-SP afirmam que a reivindicação imediata é uma só: a redução da tarifa; mas, posteriormente, que haja o debate sobre o modelo de transporte público nas cidades. Por outro lado, os meios de comunicação e demais setores da sociedade brasileira acreditam que as reivindicações devem ser mais amplas, por direitos sociais e contra a corrupção, mas ainda sem propostas concretas, além da não aceitação da PEC 37.

Os caminhos a serem trilhados no âmbito político a partir dessas manifestações estão em aberto. O que é certo é que um novo momento político na história brasileira iniciou-se com essas manifestações que reuniram milhares de pessoas nas ruas das cidades. Resta agora acompanhar as ações dos grupos sociais para saber os resultados que surgirão dessas manifestações.

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* Crédito da Imagem: 1000 Words e Shutterstock.com

Por Tales Pinto
Graduado em História

Escritor do artigo
Escrito por: Tales dos Santos Pinto Escritor oficial Brasil Escola

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PINTO, Tales dos Santos. "Protestos contra o aumento das tarifas, uma nova ação política?"; Brasil Escola. Disponível em: https://brasilescola.uol.com.br/historiab/protestos-contra-aumento-das-tarifas-uma-nova-acao-politica.htm. Acesso em 28 de março de 2024.

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